Texto originalmente publicado em 2019
Sendo um transtorno do desenvolvimento por definição, o acompanhamento dos pacientes por meio de reavaliações periódicas, nos permite avaliar a aquisição de habilidades de cada um, ao longo do tempo. E uma questão tem me preocupado em função da heterogeneidade do espectro: a individualização das intervenções terapêuticas.
Definir metas é essencial para desenvolver o trabalho com crianças autistas.
Temos que saber onde queremos chegar para planejar a abordagem terapêutica. Só que, para estabelecer as tais metas, primeiro temos que conhecer o perfil daquela criança com quem vamos trabalhar, suas características, suas dificuldades, seus pontos fortes. Temos que respeitar as necessidades da criança. Não é receita de bolo. Não dá pra colocar as mesmas metas para todos.
E tenho visto crianças autistas que passam muitas horas da semana em terapias mecanizadas, voltadas a propósitos genéricos, nem sempre relevantes para elas. Principalmente à medida que crescem, tenho visto que as metas se limitam cada vez mais à aquisição de habilidades escolares. Não estou dizendo que o avanço pedagógico não seja importante – claro que é. Mas trabalhar exaustivamente somente para que as crianças acompanhem o mesmo conteúdo que seus colegas neurotípicos na escola – enquanto deixamos de lado o desenvolvimento da comunicação, das habilidades interpessoais como um todo, da autonomia e das questões emocionais – me parece um grande equívoco.
Será que “acompanhar a apostila” é mesmo tão mais importante para a vida da criança do que o autoconhecimento, do que a desenvoltura de entrar numa padaria e comprar o que quiser ou de se expressar com clareza num grupo?
Deixo a reflexão para pais e terapeutas.