A pessoa inicia muitas atividades, mas não finaliza nenhuma delas. Começa a fazer o almoço, vai atender o telefone, vê a mensagem do vencimento de uma conta, entra no app do banco e só lembra da comida no fogo quando sente cheiro de queimado. Combina de encontrar um amigo pra devolver o livro que pegou emprestado, chega atrasada porque se distraiu olhando o Insta, conversa com ele duas horas – na hora de dormir, “descobre” que o livro ficou dentro da mochila. Perde o prazo de entrega dos trabalhos (tinha certeza que ainda faltava uma semana!). Sempre se surpreende com a maneira que os objetos parecem se mover pela casa: a escova de dentes vai parar na sala, o ingresso do show aparece dentro da gaveta de meias, o guarda-chuva nunca está em um lugar plausível quando começa a chover. A lista de exemplos tende ao infinito.
Não, não estou falando daquela situação que acontece vez ou outra na vida de todos nós, em períodos de muita sobrecarga e stress. Estou falando das pessoas que vivenciam isso dia após dia.
A sensação de desapontamento é grande, porque há um evidente desencontro entre intenções e realizações. Por maior que seja a vontade de que as coisas saiam bem, ainda assim não é o bastante para conseguir o resultado esperado. Todo esforço parece ser em vão. As outras pessoas olham torto, acham que é preguiça, desleixo, falta de responsabilidade ou de compromisso. Com o passar do tempo, a própria pessoa começa a duvidar de si mesma. Vai minando a autoconfiança, se instala um sentimento de desvalorização pessoal. Alguns falam em autossabotagem. Mas o termo certo é disfunção executiva.
Vamos entender melhor o assunto
Nosso cérebro é uma máquina incrível. Toda vez que nos propomos a realizar uma tarefa – das mais simples (como tomar banho) às mais complexas (como fazer uma pós graduação) – nós acionamos todo um sistema que nos permite planejar as ações necessárias para atingir nosso objetivo, organizá-las em etapas e monitorar a implementação de cada uma delas até o final. O êxito da empreitada envolve tomada de decisões (elencar opções e estabelecer prioridades, mantendo em mente o nosso propósito), noção de timing (o “tempo certo” de cada passo, o controle da sequência estabelecida), flexibilidade para fazer ajustes ou mudanças no caso de imprevistos (se acabar a água no meio do banho ou perder a bolsa da pós) e autocontrole. O conjunto dessas funções é conhecido por funções executivas. Elas concentram-se no córtex pré-frontal do cérebro e se desenvolvem até o início da terceira década de vida. Falhas nesta estrutura resultam em dificuldades no planejamento e na realização de atividades em geral. A isso chamamos de disfunção executiva.
Essa é uma das marcas registradas do TDAH, mas também pode estar presente no TEA. E a pergunta que não quer calar: é possível melhorar? Com certeza. Entender as próprias dificuldades é sempre o primeiro passo. O uso de medicamento e a implantação de estratégias ambientais (modelos de organização mental, sinalização e manejo do tempo) podem ajudar muito.