TDAH plus

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Não, não adianta procurar no Google. O termo TDAH-plus não existe de verdade.

É só uma expressão que comecei a usar há alguns anos, meio de brincadeira, depois de receber diversos encaminhamentos para avaliar pacientes nos quais a hipótese diagnóstica trazia uma combinação de TDAH e outros transtornos (sim, no plural: TDAH + TOC + Mutismo seletivo ou TDAH + Fobia Social + Transtorno Explosivo Intermitente + TOD, etc). 

Em um primeiro raciocínio clínico, sempre levamos em consideração que o TDAH é uma condição do neurodesenvolvimento que pode estar – e está, na maior parte das vezes – acompanhado de outra condição neuropsiquiátrica. 

Porém, aprofundando esse raciocínio inicial, quando nos deparamos com vários “transtornos” agrupados numa só pessoa, é obrigatório nos questionarmos se alguma outra condição primária não poderia ser a verdadeira responsável por essa associação. E, claro, em muitos casos, o Transtorno do Espectro Autista explica muitas das manifestações anteriormente atribuídas a esses outros “transtornos”. Ou seja, esses encaminhamentos de TDAH-plus já me deixavam em alerta para um possível TEA. 

A ideia de uma ligação próxima entre TDAH e TEA não é nova ou estranha para quem trabalha com neurociência e saúde mental. Além da conhecida sobreposição de sinais e do imenso prejuízo da disfunção executiva comum às duas condições, o parentesco genético entre elas já é bem conhecido (não por acaso, o TDAH é a condição de saúde mental mais frequente em parentes de primeiro grau dos autistas).

De uns anos pra cá, entretanto, essa questão se apresenta sob outro ângulo para mim, com o debate instigante sobre a possível existência de um perfil neuroatípico conhecido como Fenótipo Ampliado do Autismo (ou FAA). Esclarecendo para quem não estiver familiarizado com esse termo (e já me desculpando pelo texto com mais siglas desta página): FAA descreve pessoas que apresentam diversas características autistísticas, que geralmente são parentes de autistas, mas que não “fecham” o diagnóstico de autismo porque não preenchem critérios suficientes para uma conclusão segura. Nesse contexto, o termo TDAH-plus pode ganhar ainda outro significado.

A discussão sobre os limites imprecisos das nossas definições subjetivas continua. É importante lembrar sempre que a mente humana não foi desenhada com linhas rígidas, nem projetada para caber em caixinhas.

 

CRM 78.619/SP

Dra. Raquel Del Monde

É médica formada pela USP – RP (1993), com residência em Pediatria pela Unicamp (1996) e Treinamento em Psiquiatria da Infância e Adolescência também pela Unicamp (2013). Viu sua carreira mudar quando seu filho mais velho recebeu o diagnóstico de autismo em 2006. Desde então, vem se dedicando exclusivamente ao atendimento de pessoas neurodiversas, ao aprofundamento nas questões da neurodiversidade, e tornou-se uma ativista da luta anti-capacitista.